Enurese
O controlo dos esfíncteres é um marco importante no desenvolvimento da criança, por constituir um dos primeiros passos no sentido de uma maior autonomia. Este é um processo complexo e poderá ser gerador de alguma preocupação, e até de ansiedade, nos pais e famílias que possuem expetativas e procuram estratégias eficazes para que a criança seja capaz eliminar as fezes e a urina, sem ajudas. Por vezes, ocorrem alguns problemas que levam a algumas disfunções, como é o caso da enurese.
O que é a enurese?
A enurese é um transtorno de eliminação que se caracteriza pela emissão involuntária de urina depois de uma idade em que a criança deveria ter adquirido a continência urinária, entre os 4 e os 5 anos. A enurese pode ser primária, se a criança nunca adquiriu a continência urinária, ou secundária se a perturbação se desenvolve após a aquisição da continência urinária. A primeira ocorre a partir dos 5 anos de idade e a segunda é mais comum entre os 5 e os 8 anos.
A enurese pode ainda ser noturna, se a micção ocorre durante o sono noturno; diurna, se ocorre durante o dia, em estado de vigília; ou combinada, se ocorrer durante a noite e durante o dia. A emissão de urina durante a noite acontece durante o sono da criança, na fase REM (Rapid Eye Movement), que se caracteriza por uma intensa atividade cerebral, o que, não raras vezes, leva a que a criança se recorde de um sonho que envolvia o ato de urinar. Por seu turno, a enurese diurna pode incluir dois grupos: o primeiro grupo caracteriza-se por apresentar sintomas de urgência urinária e instabilidade do detrusor e o segundo, adiar a micção até resultar em eliminação da urina, o que pode advir da relutância da criança em usar a casa de banho ou preocupação com as atividades lúdicas ou escolares. Por isso, o episódio acontece mais frequentemente durante os dias escolares, principalmente durante o período da tarde.
Diagnóstico
O estudo da enurese é multidisciplinar, onde contribuem áreas como a psiquiatria, a pediatria, a urologia e a psicologia. É essencial a realização de um exame médico e a recolha da história clínica, a fim de auscultar possíveis causas orgânicas e outros sintomas associados. O diagnóstico baseia-se na idade desenvolvimental da criança, bem como na sua idade cronológica. Os critérios diagnósticos estão descritos no DSM V, nomeadamente:
A. Eliminação repetida de urina na cama ou na roupa, voluntária ou involuntária.
B. O comportamento é clinicamente significativo conforme manifestado por uma frequência de no mínimo duas vezes por semana durante pelo menos três meses consecutivos ou pela presença de sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, académico (profissional) ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
C. A idade cronológica mínima é de 5 anos (ou nível de desenvolvimento equivalente).
D. O comportamento não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., diurético, medicamento antipsicótico) ou a outra condição médica (p. ex., diabetes, espinha bífida, transtorno convulsivo).
Determinar o subtipo
– Exclusivamente noturna: Eliminação de urina apenas durante o sono noturno;
– Exclusivamente diurna: Eliminação de urina durante as horas de vigília;
– Noturna e diurna: Combinação dos dois subtipos.
Intervenção
É importante salientar que a enurese poderá ter repercussões na vida criança, nomeadamente limitações a nível social, em que evitam atividades como dormir fora de casa ou acampar, ou a nível comportamental, sentindo-se irritadas ou envergonhadas. O seu aproveitamento escolar poderá ser também prejudicado. Por parte dos pais, poderá existir frustração, o que será facilitador de punição, rejeição e raiva face à criança.
Deste modo, a intervenção na enurese abrange vários tipos de abordagem, nomeadamente farmacológica e comportamental, através de métodos de recompensas, treino de retenção de urina, técnica do alarme, entre outras.
Relativamente aos pais e cuidadores, é essencial a empatia para com a situação da criança, explicando que esse é um problema comum e que será ultrapassado e evitando a culpabilização da criança. Além disso, poderá ser criada uma rotina em que se evite a ingestão de líquidos a partir do final da tarde e incentivada a ida à casa de banho antes de deitar. Pode ainda ser criado um sistema de recompensas, em que são negociadas recompensas significativas quando a criança consegue controlar a eliminação da urina. Existem ainda técnicas que os pais poderão utilizar no controlo da bexiga, por exemplo, incentivar a criança a aumentar o intervalo entre micções, ensinar a controlar o jacto urinário, entre outras.
Dra. Raquel Baia
Psicóloga do ITAD
Clínica de psicologia e terapia da fala em Lisboa
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